quinta-feira, 24 de junho de 2010

PS e Sócrates apoiam Manuel Alegre. E agora?

(In Ruptura/FER - Quinta, 03 Junho 2010)

Agora é oficial: o PS de José Sócrates e do governo que aplica o maior ataque às condições de vida dos trabalhadores desde o 25 de Abril apoia Manuel Alegre às presidenciais de 2011. Nada que cause surpresa, pois esta é a melhor solução para o PS – que não tem alternativa com mais força eleitoral nem que lhe dê uma providencial tonalidade de "esquerda" – e para Alegre – que conta com este apoio para ganhar as eleições presidenciais. Mas esta não é a melhor solução para os trabalhadores nem para os partidos de esquerda, como o Bloco de Esquerda. Porquê?

Porque Alegre apoia os PECs

Sobre este tema, o candidato do PS não deixa dúvidas. "As medidas que foram tomadas aqui foram tomadas em Espanha e em todo o lado", disse ele em entrevista à RTP. Ele culpou os especuladores e a União Europeia – e não o governo Sócrates e o PSD que garantiu a este a maioria de votos na Assembleia da República para aprovar os PECs – por obrigarem os governos a levar a cabo planos de austeridade.

Alegre disse que teria preferido que não se tivesse chegado a esta situação, que se "tivesse cortado mais na despesa" que nos apoios sociais, mas deixou claro, como já dissera anteriormente, que não havia outro caminho. Isto é, que aplicar o PEC1 e PEC2 está correcto, que é inevitável reduzir os salários, aumentar os impostos da população, cortar no subsídio de desemprego, no investimento público e, desta forma, aumentar o desemprego e pobreza.

O candidato foi ainda mais longe e saudou o acordo entre PS e PSD no combate à crise. Isto é, para Manuel Alegre, o acordo entre PS e PSD para aprovar os PECs deve ser "saudado", "apoiado", "elogiado", pois combate a crise. Pior: disse ainda que este acordo deveria ser mais alargado para envolver todos os partidos e parceiros sociais. Isto é, que desse acordo deveriam fazer parte Bloco, PCP, CGTP, a direita, todos, numa grande concertação social. Para quê? Para apoiar o "inevitável" plano de austeridade do PS.

Por isso não é de estranhar que, na mesma entrevista à RTP, Alegre tenha dito, em relação ao movimento sindical, que este não pode ter uma "linha só de resistência". Poucos dias depois de uma manifestação nacional com centenas de milhares de trabalhadores contra as políticas do governo, a 29 de Maio, em Lisboa, convocada pela CGTP e apoiada pelos partidos de esquerda, Alegre critica a exclusividade da "linha só de resistência" e sugere uma concertação social. Para quê? Para apoiar o "inevitável" plano de austeridade do PS.

Porque Alegre é o candidato do governo Sócrates

Não há malabarismo possível: Alegre é o candidato de Sócrates e do PS, que estão no governo. Alegre tenta negá-lo com sofismas (os mesmos, aliás, repetidos no Bloco). "Não sou um candidato do PS, sou um candidato apoiado pelo PS", disse ele na mesma entrevista. Uma explicação que não convence ninguém, nem mesmo o seu actual arquiinimigo no interior do PS, Mário Soares, que reagiu com bastante contrariedade ao anúncio de Sócrates sobre a decisão do PS em apoiar Alegre.

O facto é que o apoio do PS a Alegre teve como condição o seu apoio ao programa de austeridade do governo e o seu silêncio conciliador ou respostas vazias em questões essenciais, como o desinvestimento público, o desemprego, etc. Foi por isso que as críticas feitas por Alegre ao primeiro PEC não se repetiram no segundo. Sobre o segundo, disse ser inevitável. Para ter o apoio do PS, Alegre está a pagar um preço: o preço da subserviência ao governo. O condicionamento político de Alegre ao governo PS e aos seus planos políticos é e está a ser inevitável. O resto é sofisma.

A sua gratidão a Sócrates e ao PS, sem o apoio do qual, admitiu, "é muito difícil ganhar uma eleição presidencial", ficou evidente no elogio que fez ao primeiro-ministro, considerando que, ao escolhê-lo como candidato, colocara os interesses "do partido e da esquerda" acima dos sentimentos pessoais e que agira com "ética e convicção".

Por que o Bloco insiste em apoiar Alegre?

Depois da escolha de Alegre pelo PS, o dirigente do Bloco, Francisco Louçã, disse que esta "não é uma campanha dos partidos" e que estará "ao lado dos argumentos fortes de uma campanha pela igualdade" e que "combate o abismo económico" do país. Cabe perguntar se uma campanha como a de Alegre – um candidato que apoia os planos de austeridade do governo – combate o abismo económico ou, pelo contrário, ajuda a empurrar o país para este abismo.

Louçã insiste em relembrar o Alegre do "passado", que votou contra o Código do Trabalho e as privatizações, que apresentou a sua própria candidatura, em 2006, contra a candidatura do PS na altura, de Mário Soares. Se Alegre mantivesse essa mesma postura e independência política seria correcto apoiá-lo, pois estaria claramente contra o governo PS/Sócrates e as suas políticas. Mas este Alegre não existe mais: o Alegre actual apoia a política do governo. E mais: o Alegre actual é o candidato do PS/Sócrates. No essencial, entre a de 2006 e a de agora, são candidaturas diametralmente opostas: a de 2006 era de oposição ao governo, enquanto a de agora é a da situação, é a do PS/Sócrates.

Por mais malabarismos semânticos a que se recorra, apoiar Alegre hoje é apoiar o candidato do governo Sócrates.

Direita x Esquerda

À falta de argumentos para apoiar o mesmo candidato de Sócrates, alega-se o confronto entre a esquerda, personificada na candidatura de Alegre, e a direita, de Cavaco Silva. O coordenador da Comissão Política do Bloco utiliza este argumento: apoiar Alegre seria "a única forma de responder à candidatura da direita, que é Cavaco Silva, que é a candidatura do situacionismo, que apadrinha todas as políticas que têm fechado os olhos ao desemprego e à crise económica".

Este argumento é incorrecto: há dois candidatos situacionistas: o do governo, Alegre, e o da direita que apoia o governo, Cavaco Silva. Alegre, ao apoiar a política de direita do governo Sócrates, deixa de ser uma alternativa de esquerda, mas a alternativa da confusão e da sustentação do governo, mas apresentada como de esquerda.

Infelizmente, a esquerda e os trabalhadores não têm um candidato seu, de oposição ao governo, que apoie as lutas sociais contra os planos de fome e desemprego do PS, PSD e CDS-PP e que apresente uma verdadeira alternativa à crise económica.

http://www.rupturafer.org/
Foto: DR

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