terça-feira, 6 de julho de 2010

Texto lido na Mesa Nacional do Bloco em 3 de Julho de 2010

Camaradas,

O Bloco de Esquerda, que ajudei a criar, os princípios que aprovamos, a linha política socialista que temos vindo a defender, continuam a ser a minha referência, enquanto organização política e de intervenção.

Como no Bloco de Esquerda, e muito bem, não existe centralismo democrático, sempre que discordo de alguma tomada de posição no BE tenho manifestado essa discordância, de forma aberta e frontal, quer individualmente, quer através da Esquerda Nova, tendência estatutariamente organizada no nossos movimento, que integro.

A apressada e extemporânea declaração de apoio à candidatura de Manuel Alegre à Presidência da República, despoletou forte discordância em muitos militantes do BE.

Ao contrário do que tem sido afirmado, a VI Convenção Nacional do BE, não discutiu e muito menos tomou decisões sobre o apoio a qualquer candidatura presidencial.

Continuo a considerar que foi errado o condicionamento da decisão da Mesa Nacional, com a declaração de apoio, feita antecipadamente, de forma apressada e através da comunicação social.

Daí ter subscrito, juntamente com mais 300 camaradas, o pedido de convocação de uma Convenção Extraordinária que levasse à discussão e à deliberação da candidatura a apoiar pelos aderentes do Bloco de Esquerda.

Continuo a pensar que essa teria sido a medida democrática mais acertada para dar voz aos aderentes bloquistas neste caso, mobilizando os mesmos.

É sabido que, em Portugal, o Presidente da República não governa, mas tem poderes de nomeação do primeiro-ministro e de dissolução da Assembleia da República.

Uma esquerda que não se pretenda completamente institucional não pode subvalorizar as eleições presidenciais, mas também não pode e não deve comprometer-se de tal modo com elas que deixe de ter margem de manobra para os combates presentes, contra o capitalismo selvagem, que procura destruir o Estado Social e põe em causa a democracia que fomos construindo desde o 25 de Abril.

A massificação e o alargamento das lutas deverá constituir o primeiro objectivo de uma organização como o Bloco de Esquerda. Tenho sérias dúvidas sobre se essa massificação e alargamento passam por umas eleições presidenciais…

A proposta da consigna de construção de uma Maioria Social de Esquerda mantém-se perfeitamente actual e a forma de a concretizar é no terreno das lutas que vão surgindo e não em acordos de gabinetes.

As presidenciais só podem ser olhadas como mais um factor na construção desta maioria social e não a sua concretização.

O Bloco de Esquerda tem que, de uma vez por todas, procurar antecipar-se aos acontecimentos e preocupar-se em criar raízes lá onde as lutas populares estão a eclodir.

Desta forma o Bloco ganhará o reconhecimento e a aceitação de sectores da população pouco politizados ou que têm seguido a chamada social-democracia, dando-lhes uma perspectiva nova e alternativa e não comprometendo-se com candidaturas conjuntas cujo processo não é de fácil explicação.

Nesta iniciativa de tentar a convocação de uma convenção extraordinária tive oportunidade de contactar com muitas dezenas de camaradas do Bloco e de verificar o estado de desagrado que se verifica face à situação a que o nosso movimento chegou do ponto de vista organizativo, que leva ao afastamento de camaradas a um ritmo preocupante.

Os camaradas sabem, tão bem quanto eu, que as mais de 300 assinaturas apresentadas são mais do que suficientes para convocar uma Convenção. O que fazemos constar acerca de sermos mais de 8.000 aderentes só pode ser entendido como propaganda. Todos sabemos quantos aderentes intervieram na última Convenção, todos sabemos quantos aderentes votaram nas últimas eleições para as distritais. Nesta Mesa Nacional o que deveríamos ter era informação fidedigna do número real de aderentes, a par do compromisso da sua confidencialidade. Entre nós deveríamos distinguir a informação e a propaganda. Tais procedimentos ajudariam a cimentar a confiança entre nós.

Muitos destes camaradas subscritores do pedido de convenção extraordinária não são aquilo a que de uma forma insultuosa e altamente sectária tem sido chamados por alguns camaradas de “o lixo do Porto” ou “os malucos de Ovar” ou do Algarve. Tais epítetos dizem bem do estado a que chegamos em termos de discussão política.

Muitos dos camaradas que assinaram a petição representam o Bloco de Esquerda em Autarquias, em Sindicatos e nos seus locais de trabalho e de socialização. Para muitos, a única finalidade política é a constituição de um Bloco forte e democrático, sem procurar organizar fracções nem recrutar adesões paralelas.

Tem sido recorrente a afirmação pública de que o Bloco é o mais democrático dos partidos, dando como exemplo o facto de existirem correntes minoritárias representadas nos orgãos dirigentes. Infelizmente o que vemos é que as correntes minoritárias dentro do BE têm sido não só desrespeitadas como até insultadas, parecendo ser a cereja no cimo do bolo, para propaganda nos meios de comunicação.

O que se exige é simples, o mesmo respeito democrático dentro do nosso movimento que exigimos na sociedade e face às outras forças políticas, onde embora minoritários, representamos com dignidade o Bloco de Esquerda.

Não quero o nosso movimento igual à maior parte dos outros partidos da cena política portuguesa, isto é, um mero partido de eleitores e funcionários, completamente institucional e sem um efectivo entrosamento com as populações e as suas lutas.

Não é ainda tarde para invertermos o caminho e retomarmos as linhas traçadas há mais de dez anos. Desejo que o Bloco seja um partido/movimento, amplamente democrático, em luta pelo socialismo. Penso que, se dermos sinais muito claros nesse sentido, alguns dos camaradas que se têm vindo a afastar do Bloco continuarão a estar dispostos a colaborar neste projecto comum.

A situação política e social em que vivemos não se compadece com divisões artificiais numa força política em que tanta gente já demonstrou ser capaz de acreditar.

Uma organização política como o BE não é necessariamente um grupo de amigos, mas é de exigir solidariedade e respeito entre os seus membros.

Ferreira dos Santos

ESQUERDA NOVA http://www.esquerdanova.net/

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